24 agosto 2009

O conselho de Gamaliel é uma prerrogativa cristã?


Por Leonardo Gonçalves

Em nosso Brasil hodierno, as seitas pseudo-cristãs tem se multiplicado com tal rapidez, que é possivel presenciar diariamente o surgimento de diversas instituições eclesiásticas que, apesar de exibirem a alcunha de “cristãs” ou “evangélicas”, pouca semelhança têm com Cristo e seu evangelho. Tais movimentos, apesar de falarem no nome de Deus, trazem em seu bojo doutrinário uma série de preceitos alheios à Palavra de Deus. Correntes de libertação, pregações triunfalistas com ênfase em prosperidade financeira e muitos milagres são exibidos pelos apóstolos do momento. Estas lideranças costumam valer-se dos milagres para autenticar seus ministérios e amedrontar aqueles que lhes são contrários.

A intimidação espiritual e a falta de exegese autêntica são as marcas destes ministérios emergentes. Certo tele-apóstolo, aquele que cura as pessoas com a sua “sudorese santa”, costuma respaldar-se nos milagres que produz. “Olha o milagre aí igreja! Quero ver dizer agora que eu não sou homem de Deus.” – reverbera Valdemiro Santiago, fundador da Igreja Mundial do Poder de Deus. “Se essa obra não for de Deus, vai acabar; mas se ela for de Deus, ninguém vai nos parar” - diz o apóstolo, supostamente respaldado pelo conselho de Gamaliel, em At 5.34-39:

“Mas, levantando-se no conselho um certo fariseu chamado Gamaliel, doutor da lei, venerado por todo o povo, mandou que, por um pouco, levassem para fora os apóstolos; e disse-lhes:

Varões israelitas, acautelai-vos a respeito do que haveis de fazer a estes homens.Porque, antes destes dias, levantou-se Teudas, dizendo ser alguém; a este se ajuntou o número de uns quatrocentos homens; o qual foi morto, e todos os que lhe deram ouvidos foram dispersos e reduzidos a nada. Depois deste, levantou-se Judas, o galileu, nos dias do alistamento, e levou muito povo após si; mas também este pereceu, e todos os que lhe deram ouvidos foram dispersos.

E agora digo-vos: Dai de mão a estes homens, e deixai-os, porque, se este conselho ou esta obra é de homens, se desfará, mas, se é de Deus, não podereis desfazê-la, para que não aconteça serdes também achados combatendo contra Deus”.

O argumento apresentado por Gamaliel, famoso rabino da seita dos Fariseus, tem sido perpetuado como sendo um conselho verdadeiro e inspirado. Muitos defensores dos novos movimentos de fé também se valem deste argumento quando dizem:

“Não fale do bispo tal, porque ele é ungido de Deus. Aliás, se ele não é de Deus, como a igreja dele cresce tanto? Deixa ele, pois se essa obra for de Deus, você estará lutando contra Deus!”


Onde está o problema com o conselho de Gamaliel?

Em primeiro lugar, devemos reconhecer que na Bíblia há registros inspirados e mandamentos inspirados. Ela é descritiva e prescritiva. Por exemplo: A Bíblia descreve algumas das mentiras de Satanás, mas ela não ensina a mentira. As mentiras do diabo, portanto, são descrições e não prescrições. Ela também descreve o adultério de Davi, mas não prescreve o adúltério. Ela descreve a traição de Judas, mas isso não quer dizer que o cristão deve trair a confiança dos seus amigos. A boa heremenêutica nos exorta a reconhecer que nem tudo o que está na Bíblia é um mandamento para o cristão.

O mesmo acontece com o conselho de Gamaliel. A Bíblia o descreve, mas não prescreve sua atitude como correta. Ora, Gamaliel sequer era cristão; muito pelo contrário: Ele era membro da seita que mais se opôs ao cristianismo durante os primeiros anos da sua existência. Além disso, a premissa de Gamaliel não resiste à prova da história: A experiência humana tem se encarregado de provar que o argumento deste rabino judeu não passa de uma grande falácia. Quantas seitas que surgiram desde antes do advento do cristianismo, e que perduram até hoje?

Tomemos como exemplo o budismo. A seita fundada por Sidharta Gautama mais de 500 anos antes do nacimento de Cristo perdura até hoje, tendo milhares de adeptos ao redor do mundo. Ora, se o argumento de Gamaliel estiver correto, então serei forçado a crer que o budismo, religião que ensina a reencarnação, animismo e tantas outras abstrações, também é de Deus! Lembre-se que passaram mais de dois milênios e a religião contina crescendo em número de adeptos, inclusive no Brasil. O mesmo pode ser dito do Confucionismo, Jainísmo e Taoísmo, todas com mais de quatro séculos antes do cristianismo! Numa tradição mais recente está o maometismo (islamismo), com cerca de quinze séculos de história, o que segundo o conselho de Gamaliel, é mais do que suficiente para justificar a fé terrorista que se impõe por meio da espada.


Gamaliel versus Paulo de Tarso

Apesar de ter sido instruído aos pés de Gamaliel, o ex-fariseu Paulo de Tarso não se deixava enganar pelo seu estranho pressuposto do antigo mestre. O apelo à “tolerância” de Gamaliel fora abandonado tão logo o cristianismo começou a ser bombardeado pelas doutrinas dos falsos mestres. Diferente de Gamaliel e seu apelo à conivência, o apóstolo dos gentios se opôs a tudo aquilo que pusesse tropeço a obra de Deus:

* Repreendeu a Pedro na cara, por sua dissimulação – Gl 2.11-14
* Mandou Tito “tapar a boca” dos falsos mestres – Tt 1.10-11
* Chamou os falsos obreiros de cães – Fp 3.2
* Citava nomes, quando julgava preciso – 2 Tm 2.17; 2Tm 4.10

Paulo não estava disposto a seguir o conselho de Gamaliel. Ele já não estava submisso ao antigo rabi. Seu mestre agora era outro, o Cristo.


Gamaliel versus Jesus Cristo

Penso sinceramente que estes que se respaldam em Gamaliel estão em franca oposição ao evangelho. Ora, diferente do rabino fariseu, que em sua “extrema prudência” nos conclama a abrir mão do sublime dom de discernir, crendo que Deus dará aos falsos mestres o mesmo destino de Teudas e Judas Galileu (At 5.36-37), ordenando sobre eles perseguição e matando-os à espada (bem ao estilo dos fariseus!), Cristo nos ensina a discernir a conduta dos falsos mestres, julgando-os à luz dos seus frutos:

“Acautelai-vos, porém, dos falsos profetas, que vêm até vós vestidos como ovelhas, mas interiormente são lobos devoradores. Por seus frutos os conhecereis. Porventura, colhem-se uvas dos espinheiros ou figos dos abrolhos? [...] Toda árvore que não dá bom fruto corta-se e lança-se no fogo. Portanto, pelos seus frutos os conhecereis” – Mt 7.15-19

Jesus ensinou que não devemos nos deixar seduzir por milagres, pois, diferente do que diz o teleapóstolo da Igreja Mundial do Poder de Deus, os milagres não autenticam o ministério de ninguém:

“Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor! entrará no Reino dos céus, mas aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus. Muitos me dirão naquele Dia: Senhor, Senhor, não profetizamos nós em teu nome? E, em teu nome, não expulsamos demônios? E, em teu nome, não fizemos muitas maravilhas? E, então, lhes direi abertamente: Nunca vos conheci; apartai-vos de mim, vós que praticais a iniqüidade” – Mt 7.21-23


Ora, ainda sobre milagres, cabe dizer que João Batista não realizou nenhum milagre (Jo 10.41), mas Jesus testificou dele dizendo que ele foi o maior entre os homens (Mt 11.11). Por outro lado, o ministério de Judas foi seguido por sinais (Mt 10.1), mas Jesus testificou contra ele chamando-o de diabo! (Jo 6.70)



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Fonte: Púlpito Cristão

3 comentários:

  1. Leonardo, Você admira o ensino e a pessoa do Caio Fábio e resolver expressar isso através de uma postagem, que aliás ficou muito boa. Algo perfeitamente natural. Mas, pela polêmica instalada, parece que há pensamentos contrários, o que é compreensível, as pessoas terem posicionamentos diferentes. O que assustou, foi a forma como estas diferenças de idéias foram colocadas. Puxa vida, quanto julgamento sem misericórdia! Em nome de uma “suposta” defesa da ortodoxia, bons costumes e moral religiosa, o que se viu foram pessoas praticamente mandando o Caio para a fogueira da inquisição e ainda reservando um lugar para você, que simplesmente expressou sua opinião pessoal sobre ele. Frases como: “Ele pecou”, “Está em pecado”, “É um adúltero”, “Vive com outra mulher”, “Baixou um cantor do mundo em um reunião que dirige”, “Apoia os jovens a fazerem sexo antes do casamento”, “Não é homem de Deus”, “É divorciado”. Gente, o que é isso? Não é isso que o Evangelho de Cristo nos ensina. Porque se conhecessem o Evangelho de Jesus, não atirariam pedras, não pronunciariam palavras de juízo, saberiam o significado de misericórdia e não sacrifícios. Acampanho o ministério de Caio Fábio há uns 20 anos ou mais, através dos seus programas de Tv e pelos seus livros. Lembro como ele era incensado pelas lideranças evangélicas, pela sociedade civil do Rio e pela própria mídia. Era considerado o “Billy Graham do Brasil” (frase do Dr. Russell Shedd), o melhor pregador, reserva ética em relação aos modelos representados por Edir Macedo. Lamentei quando estourou o “Dossiê Cayman” em 1998, o qual depois o próprio ex-presidente Fernando Henrique pediu para retirar o nome dele do processo. Fiquei triste quando no início de 1999, o próprio Caio divulgou um comunicado na internet, revelando seu divórcio e seu relacionamento extra-conjugal. Foi abandonado pelos mesmos líderes que antes o bajulavam, com exceção de poucos. Seus livros sofreram boicote nas livrarias evangélicas e editoras. Voltou dos Estados Unidos no final de 1999 e pediu perdão através da Revista Eclésia. Em 2000, terminou o relacionamento que desencadeou o divórcio. Em 2001, se casou novamente com uma pastora de uma comunidade evangélica. Falou-se na época, pelas revistas evangélicas, na “volta de Caio Fábio”. Nesse mesmo ano, reinicia seu ministério praticamente do zero com o “Café com Graça” em Copacabana. Em maio de 2002, em uma viagem profissional ao Rio, estive no local onde se realizavam as reuniões. Era pequeno e nada parecia as reuniões repletas que Caio antes falava. Começou a escrever livros novamente, “Neplin”, “Tábuas de Eva”, “Enigma da Graça” e “Sem Barganhas com Deus”, publicados entre 2000 a 2005. Em 2004, seu filho caçula, Lukas, morre em trágico acidente. A alavancada do retorno ministerial, se dá mesmo com a criação do seu site em 2003 e do início do “Caminho da Graça” em 2004 em Brasília. O movimento cresce e cria filiais (Estações do Caminho) em vários Estados e até em outros países. Foi errado, seu divórcio e adultério? Foi. Ele pecou? Não só ele, mas a Biblia diz que todos pecaram e bem aventurado a quem o Senhor não imputa pecado. Ou seja, só Deus pode imputar pecado em alguém. Ele está em pecado? Não sei, quem estiver sem pecado, que atire a primeira pedra. Pastor divorciado? Tenha paciência. O que tem de pastor divorciado por aí não está no gibi. Pior ainda é os que estão casados no papel, mas vivem conjugalmente divorciados, e ainda exilam a esposa, para manter seus “casos”. É errado, mas cada um dará conta de si mesmo a Deus. Caio Fábio tem abençoado a minha vida e a de muitos com seu ensino, sem “barganhas com os homens e com Deus” e para mim, isto basta.

    Um abraço. (O comentário era para ser postado no púlpito cristão, mas após várias tentativas desisti, porque dava erro de página).

    www.juberdonizete.blogspot.com/ - Pr. Juber Donizete Gonçalves

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  2. paz do senhor meu querido irmão.

    me fala uma coisa?como alguem depois de ler um artigo desses pode por um comentario desses.

    gostei muito da postagem Deus seja louvado.

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  3. Brilhante texto, Leonardo. Brilhante explanação sobre o uso correto das Escrituras.

    Estou reproduzindo ele num dos blogs que ajudo a manter, o Blog da Umadf (http://umadf.blogspot.com).

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